Código de Ética Médica (Reflexões) - Parte 2
Excertos da magnífica obra "Código de Ética Médica 2010 - Comentado e Interpretado" do Dr Edmilson de Almeida Barros Junior.
Sobre o tema recusa de atendimento É direito do Médico:
IV - Recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar a própria saúde ou a do paciente, bem como a dos demais profissionais. Nesse caso, comunicará imediatamente sua decisão à comissão de ética e ao Conselho Regional de Medicina..
A Resolução CFM 1.451/95 define urgência como sendo a ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata. Por exemplo: queda de moto apenas com fratura de clavícula. Por sua vez, emergência foi definida como a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo, portanto, tratamento médico imediato. Por exemplo: ferimento por arma de fogo na cabeça ou tórax.
Ainda sobre o tema recusa de atendimento É vedado ao Médico:
Art. 33. Deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em casos de urgência ou emergência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo.
O bem-estar do paciente é o único objetivo buscado, mas, infelizmente, nem sempre alcançado. Ocorre que o médico, assim como toda e qualquer pessoa, é falível e possuidor de valores, crenças e, por que não, também de sentimentos de amor e desamor. O médico é dotado de liberdade e consciência, que se exteriorizam através de sua autonomia profissional. É exatamente assim; tal qual o paciente e familiares, o médico é possuidor de autonomia.
Pois bem, mas assim como aqueles, essa autonomia não é absoluta. O ordenamento jurídico prevê limitações, fazendo prevalecer outros valores mais relevantes do que essa autonomia. Para o médico, enquanto pessoa autônoma, se assegura a recusa deste em prestar seus serviços, quando ocorrer qualquer das situações:
- quando estes contrariem os ditames de sua consciência;
- quando haja risco de prejuízo a sua saúde ou a de qualquer pessoa, se acaso continuar prestando serviços em alguma instituição de saúde, onde as condições de trabalho não sejam dignas ou adequadas;
- quando se recusa a atender alguém que não deseje, seja por amizade, inimizade ou mesmo desinteresse motivado ou não. Aqui se incluem as ocasiões, cada vez mais comuns, de o médico se sentir constrangido ou ameaçado (física ou verbalmente) pelo paciente, amigos e/ou familiares.
Limitando-se a este último, posto que relacionado ao presente artigo, há de se entender que a quebra da confiança e credibilidade pode ser o impulsionador desse desejo do médico de não prestar o atendimento médico. Muito mais do que simples direito, respeitar essa recusa reflete a permanente garantia de independência e imparcialidade nos atos médicos, e é dever do médico, sempre que ocorra risco de comprometimento da relação médico-paciente ou do seu desempenho profissional.
Se a regra é essa, por outro lado existe a exceção. Sob pena de cometer infração ética, é vedada a recusa de atendimento médico em algumas situações especiais que taxativamente são:
a) ausência de outro médico;
b) caso de urgência ou emergência;
c) quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.
Ainda sobre o tema recusa de atendimento É vedado ao Médico:
Art. 36. Abandonar paciente sob seus cuidados.
§ 1º Ocorrendo fatos que, a seu critério, prejudiquem o bom relacionamento com o paciente ou o pleno desempenho profissional, o médico tem o direito de renunciar ao atendimento, desde que comunique previamente ao paciente ou a seu representante legal, assegurando-se da continuidade dos cuidados e fornecendo todas as informações necessárias ao médico que lhe suceder.
§ 2º Salvo por motivo justo, comunicado ao paciente ou aos seus familiares, o médico não abandonará o paciente por ser este portador de moléstia crônica ou incurável e continuará a assisti-lo ainda que para cuidados paliativos.
Infelizmente, o avanço social e tecnológico tem provocado uma fragilização dessa relação, muitas vezes rompendo-a de forma abrupta e irreversível.
A critério do profissional, sempre que haja motivo justo, principalmente quando essa relação médico-paciente estiver comprometida, ainda que não definitivamente rompida, ou se entender que existe algum tipo de obstáculo ao seu pleno desempenho profissional (como recusa taxativa a receber uma eventual transfusão sanguínea ou faltas de condições dignas), com base na autonomia profissional, permite-se, sob condições especiais e prévias, que o “médico renuncie (jamais abandone) ao atendimento.
Vale ressaltar a diferença no atendimento eletivo geralmente realizado nos consultórios e o atendimento de emergência e urgência geralmente prestado no pronto-socorro dos hospitais. Nos hospitais quando ocorre o atendimento de urgência e emergência é vedado o médico ou hospital negar o atendimento alegando quebra da confiança independe mente do que aconteça, sob pena de responsabilidade civil, penal e administrativa.
Sob pena de infração ética ao presente artigo, deve o médico observar o cumprimento de alguns requisitos indispensáveis, antes de efetivar a renúncia: comunicar ao paciente (se este estiver em gozo pleno de suas faculdades mentais) e/ou aos responsáveis legais (família).
Não existe hipótese de o médico abandonar o paciente; por outro lado, a renúncia é prevista e legalmente aceita, afinal, salvo risco iminente de morte, único médico na localidade (município), urgência ou emergência, nenhum esculápio está obrigado a prestar um atendi mento a quem este não queira, independentemente dos motivos.