Carlos González: "Seu filho não precisa comer de tudo. Pelo contrário: ensiná-lo isso pode até ser prejudicial"

Ensinar seu filho a comer de tudo não é necessário. Mais do que isso: pode até ser prejudicial a ele e a você

Um dos grandes mitos atuais é o de que é preciso ensinar as crianças a comerem de tudo. Em nome desse princípio sagrado, se obriga os pequenos a comerem coisas que não querem ou até das quais não gostam; ou fazendo negociações absurdas (Se você quer brincar, primeiro precisa comer pelo menos dois pedacinhos de peixe...

Não, esses dois são muito pequenos; se escolher os menores, terá de ser três, mais meia cenoura!). Algumas crianças são castigadas (sem brincar, sem história, sem televisão, sem sobremesa...) por não terem comido a verdura, e não são poucos os pais que repetem, convencidos: Não diga que não gostou, se você não experimentou. Terríveis palavras das quais um dia terão de se arrepender. Porque em 15 anos, talvez menos, alguém vai oferecer ao seu filho um cigarro, álcool, heroína, sexo sem proteção...Tem certeza que quer ensinar a ele que não pode dizer não sem ter provado?

Acredito que seja bom as crianças aprenderem, desde o começo, que têm o direito a dizer não e que sua negativa seja respeitada. Nunca foi necessário comer de tudo. Se você come pera, não precisa comer também melão. Nossos avós tinham dietas imensamente monótonas. Havia países de trigo, outros de arroz ou de milho. Zonas onde se cultivavam as maçãs e outras onde se davam melhor as melancias. Regiões de batata e regiões de mandioca.

Uns comiam lentilhas, outros, feijão e outros, grão-de-bico. A alguns quilômetros da costa, o peixe era quase desconhecido, não havia barcos e caminhões levando alimentos até a outra ponta do globo. Mas, se comer de tudo já era desnecessário, hoje em dia é, francamente, perigoso.

Explore qualquer supermercado com itens de alimentação: quantos metros de prateleira são dedicados às batatas de verdade e quantos aos saquinhos de batatinhas fritas e outros aperitivos crocantes, que não se sabe de que são feitos? Quantos metros são dedicados aos tomates e quantos às garrafas plásticas cheias de ketchup e outros molhos parecidos? Quanto espaço ocupa o pão, aquele feito só com farinha e água, e quanto ocupam os biscoitos com ou sem chocolate, bolos, muffins e tortas... com muita farinha, gordura e açúcar? Quantas couves-flor estão à venda e quantas garrafas de dois litros de bebidas açucaradas?

É triste, mas o que está à venda é o que as pessoas compram. A maior parte da comida que nos vendem nem merece o nome de comida. Se tivermos de ensinar algo a nossos filhos não é comer de tudo, mas a recusar mais da metade dos alimentos que lhes queiram vender.