O que eu posso fazer para ter mais leite?

Trecho do livro do Dr Carlos Gonzales:

E para que diabos você quer ter mais leite? Está pensando em montar uma mercearia?

A preocupação das mães com se terão leite suficiente é muito antiga: séculos atrás, quando todo mundo amamentava, já havia virgens e santos “especializados” no leite bom, além de ervas e poções de grande prestígio.

É possível que esse temor venha do desconhecimento. As pessoas acreditavam que a quantidade de leite dependia da mãe: havia mães com muito leite e outras com pouco leite, mães com leite bom e outras com leite ruim.

No nosso mundo acelerado, há cada vez mais “leite ruim”, mas hoje sabemos que não é culpa das mães, mas, sim, do filho. Há bebês que mamam muito e outros que mamam pouco, e a quantidade de leite será sempre exatamente aquela que o bebê mamar.

Exatamente? Pois é isso mesmo. A produção de leite está regulada, minuto a minuto, pela quantidade que seu filho tomou na mamada anterior. Se o bebê tinha muita fome e acelerou até o fim, o leite será fabricado em grande velocidade. Se, no entanto, o menino estava sem fome e deixou o peito pela metade, o leite será fabricado devagarinho. Isso foi demonstrado por meio de medições cuidadosas do aumento do volume do peito entre mamadas.²?

Para que uma mãe tenha pouco leite, ou seja, menos do que seu filho precisa, é necessário que se dê uma das seguintes situações:

1. Que o bebê não mame o suficiente (por exemplo, se estiver doente, ou porque encheram sua barriga de água, soro glicosado ou chazinhos, ou lhe deram mamadeiras).

2. Que o bebê mame, mas mal (por exemplo, se ele posiciona mal a língua porque foi acostumado a chupetas e mamadeiras, ou se está fraco porque perdeu muito peso, ou tem um problema neurológico ou um freio lingual muito curto que não permite que ele mova bem a língua).

3. Que não deixem o bebê mamar, porque tentam amamentá-lo seguindo um horário, ou distraí-lo com chupetas quando ele pede o peito.

Fora esses três casos (e alguma doença rara, das quais há um entre milhares), todas as mães terão exatamente o leite que seu filho precisa.

Portanto, diante da pergunta “o que eu faço para ter mais leite”, o primeiro passo é comprovar se realmente há um problema (se o bebê está perdendo peso ou ganhando muito pouco). Será, então, algum dos três casos anteriores ou uma mistura dos três, e isso terá que ser solucionado. Se o bebê estiver doente, averiguar o que ele tem e tratar. Se estiver tão fraco que não consegue mamar, extrair o leite e dar a ele por outro método. Se estiverem dando água ou chupeta ao bebê, parar de dar. Se ele estava tomando mamadeiras, tirá-las também (tirar de repente se davam pouco ou gradualmente ao longo de alguns dias se davam muito). Se o bebê não estava mamando em uma boa postura, colocá-lo direito para que ele volte a aprender. Será muito útil contar com a ajuda de um grupo de mães, como a Liga do Leite ou Via Láctea. Há dezenas de grupos de apoio à amamentação na Espanha, uma lista atualizada pode ser encontrada em .*

Entretanto, há muitíssimos casos em que a mãe acredita, por algum motivo, que não tem leite (o suficiente), e está errada sobre isso.

Alguns dos “sintomas” falsos de falta de leite podem ser:

• O bebê chora.

• O bebê não chora.

• O bebê pede o peito antes das três horas.

• O bebê pede o peito depois das três horas.

• O bebê demora mais de dez minutos para mamar.

• O bebê mama em cinco minutos e depois não quer mais.

• O bebê mama durante a noite.

• O bebê não mama durante a noite.

• Minha mãe também não teve leite.

• A minha mãe tinha leite (e eu não).

• Os peitos estão muito cheios.

• Os peitos estão muito vazios.

• Meus seios são pequenos demais.

• Meus seios são grandes demais.

• Não tenho mamilo.

• Tenho três mamilos. (Você riu? Muitas mães afirmam com seriedade que “não têm mamilo”, e eu garanto que é muito mais fácil ter três mamilos do que nenhum).

Preocupada por qualquer um desses sintomas, a mãe decide fazer alguma coisa para ter mais leite. Se ela opta por alguma coisa inútil, mas inofensiva, como comer amêndoas ou acender uma velinha para Santo Antônio, provavelmente não acontecerá nada ruim, e é até possível que a fé faça a mãe pensar que de fato aumentou a quantidade de leite, assim estão todos felizes.

Mas às vezes a mãe tenta fazer alguma coisa que de fato funciona, ou que pelo menos pode funcionar. E nesses casos os conselhos de gente que sabe alguma coisa sobre amamentação podem ser ainda mais nefastos do que aqueles de quem não sabe nada.

A história de Helena nos mostra o nível de angústia ao qual se pode chegar nos primeiros meses quando se combinam os importunos dez minutos, o maldito peso e alguns conselhos aparentemente razoáveis, mas totalmente improcedentes porque não havia nenhum problema a ser resolvido:

Meu filho de três meses e dez dias pesa somete 5,640kg, nasceu com 3,120kg e perdeu peso nos três primeiros dias até chegar a 2,760kg. O problema principal é que ele nunca quer mamar. Primeiro eu dava o peito a cada três horas, mas ele sempre mamava muito pouquinho. Depois o pediatra aconselhou a cada duas horas e, como a situação não mudou, me aconselharam a colocá-lo no peito o tempo todo. A situação não melhorou em nada e se descontrolou. Ele só mama bem e tranquilo à noite, e durante o dia só mama quando está meio adormecido. Fiz tudo o que me mandaram fazer: esvaziar o peito antes de oferecer para que ele receba leite com mais calorias, fazer uma dieta sem leite de vaca e derivados e mais mil coisas que estão me deixando louca e que até agora não estão servindo para nada. Tentamos dar mamadeira, mas ele também não quis. O pediatra diz que ele está saudável (já fizeram exame de urina) e tudo saiu normal, mas essa situação é realmente difícil para mim. Vivo com a angústia contínua de pensar se ele comerá ou não na próxima mamada, e tenho que estar sempre atenta ao momento em que ele dorme para colocar o mamilo na sua boca e esperar para ver se tenho sorte e ele bebe alguma coisa. Nunca posso fazer nada, quase não posso sair de casa com medo do meu filho de repente ter vontade de mamar, e além de tudo estou preocupada porque o peso do meu filho é inferior à média.

O peso desse bebê está no percentil 7, ou seja, sete de cada cem bebês saudáveis da sua idade pesam menos, 35.000 dos 500.000 que nascem a cada ano na Espanha. Como estarão as mães desses outros 35.000? É um peso totalmente normal.

Mas o problema grave não foi o peso, mas que ele “mamava muito pouquinho”, ou seja (porque com o peito não se sabe quanto mamam), ele mamava muito rápido. Quanto sofrimento poderiam ter evitado se, desde a gravidez, tivessem explicado a essa mãe que alguns bebês mamam mais rápido e outros mais devagar, e que não é necessário em absoluto olhar o relógio. Quanto sofrimento poderiam ter evitado se, na primeira vez em que essa mãe disse “meu filho mama muito pouquinho”, alguém tivesse respondido: “Claro, ele é tão esperto que já aprendeu a mamar rápido!”. Em vez disso lhe disseram que sim, que havia um problema, que ele mamava pouco… E lhe aconselharam para que ele mamasse mais. Conselhos, naturalmente, destinados ao fracasso, pois o bebê não precisava e, portanto, não podia mamar mais.

Em apenas quatro meses, a situação se deteriorou tanto que o bebê só mama dormindo. Um psicólogo poderia falar sobre a rejeição à alimentação, que o impede de mamar acordado. Talvez nos explicasse aquilo do “peito bom e peito ruim”. Mas não é necessário entrar em profundidades psicológicas para advertir que se o bebê já mamou dormindo e tomou tudo o que precisava assim (o que é evidente, porque ele vai engordando com normalidade), é impossível que ele volte a mamar acordado. E ele tem apenas quatro meses, ainda faltam as sempre tumultuadas papinhas e a perda de apetite ao redor de um ano. Se não houver uma mudança radical, a situação dessa família pode chegar a ser desesperadora.

Como o bebê vê essa situação? É claro que ele não entende nada. Ele não sabe sobre os dez minutos, nem sobre o percentil 7 de peso. Estava tão tranquilo mamando o tanto que quisesse, e de repente começaram a acontecer coisas estranhas. Começaram a acordá-lo para dar o peito com mais frequência. Com a sua melhor boa vontade ele tentou se adaptar, fazendo as mamadas mais curtas, é claro. Às vezes alguém tinha tirado o leite mais aguado que sai no princípio da mamada, e desde a primeira chupada saía o leite espesso, com mais gordura e mais calorias. É lógico que nessas mamadas ele acabava ainda mais rápido. Naturalmente, ele não quis nem provar a mamadeira (“mas se eu já mamei oito vezes essa manhã!”). Cada vez respondia da forma mais lógica, incapaz de compreender que sua mãe e os que a aconselhavam se angustiavam cada vez mais. Há umas semanas começou a ter estranhos “pesadelos”: sonha que um peito é introduzido na sua boca e que seu estômago se enche de leite. E o mais estranho é que esse sonho parece estranhamente real. Ele acorda farto, pesado, e é incapaz de mamar durante o dia.

Sua mãe parece cada dia mais preocupada. Muitas vezes a vê chorar e tem medo. Se pudesse falar, sem dúvida diria o mesmo que sua mãe nos diz: “Estou ficando louco”. E se pudesse entender o que acontece, com certeza tentaria mamar mais devagarinho para durar os dez minutos rigorosamente (mas mamando a mesma quantidade, é claro, também não é para ficar empanturrado), para que assim todos ficassem tranquilos. Mas ele não entende o que está acontecendo, não pode fazer esse gesto de boa vontade. Sua mãe é a única que pode fazer a mudança. De outro modo, o problema continuará durante meses ou anos.