Quando se está só

Sérgio Pimenta, nasceu em 1954, no Rio de Janeiro. Integrou o grupo Vencedores por Cristo e Grupo Semente (com os amigos Nelson Bomilcar, Gerson Ortega, Marcos Monaco) e tornou-se autor de músicas que se tornaram verdadeiros clássicos na música cristã brasileira, como Cada Instante, Você pode ter, e Aquele que me ama. Compôs mais de 500 músicas, algumas das quais ainda inéditas.

Casou-se em 1982 com Sonia Dimitrov e tiveram dois filhos: Renato (1984) e Juliana (1986). Faleceu em 1987, aos 32 anos, no Hospital do Câncer de São Paulo. Uma de suas composições que mais marcaram meu coração é Quando se está só, escrita por Pimenta enquanto lutava contra o câncer e musicada por Nelson Bomilcar.

Quando se está só, o silêncio é mais profundo
As noites são mais longas, o frio mais intenso
E até a própria sombra parece estar mais junta
Como se soubesse quando se está só



Quando se está só, um grito é desespero
Sussurro é loucura, o estalo mete medo
E a mão forte aparece e está sempre nos sonhos
Eternos pesadelos quando se está só



Quando se está só, se está porque deseja
Pois ele com certeza não foge de ninguém
Deus está sempre perto, amigo, abraço aberto
Convida a ir com ele pra não mais está só...



Quando se está só, se está porque deseja
Pois ele com certeza não foge de ninguém
Deus está sempre perto, amigo, abraço aberto
Convida a ir com ele pra não mais está só...
Pra não mais está só...

Continuando minha série de reflexões sobre o Salmo 23 gostaria de meditar um pouco no verso 4:

Mesmo quando eu andar por um vale de trevas e morte...

O salmista segue seu pastor.De repente ele se vê num vale escuro e medonho. Um vale é uma região cercada de altas montanhas. Por causa deste relevo acidentado, o caminho geralmente se torna sinuoso, com subidas e descidas... caminhar por um vale é um desafio! E ele não chega ao vale porque ter fugido do seu pastor, mas foi precisamente o pastor que o levou ao vale.

Esta não é uma ideia completamente alheia na Bíblia. O evangelho de Mateus (4:1) diz que Jesus foi levado pelo Espírito Santo ao deserto, para ser tentado pelo Diabo. Durante nossa jornada Deus nos conduz em situações difíceis, que tiram o sorriso da nossa face, e colocam à prova nossa fé. 

Observe, porém, que o salmista fala de uma sombra da morte. O que é uma sombra? A sombra acontece quando algo bloqueia a luz. Não haveria sombra se não houvesse o brilho do sol. Muitas pessoas são tão afetadas pela sombra do sofrimento que perdem as forças para prosseguir e ficam paralisadas. Elas sabem como sair do vale mas tem medo de se machucar de novo. Preferem viver uma vida na sombra, contemplam a luz através de uma sombra.

No entanto, é só quando saímos do vale que conseguimos contemplar a natureza de Deus em sua totalidade.


...não temerei perigo algum, porque tu estás comigo.

Observe a forma como Davi usa os pronomes ao se referir a Deus:

1 O Senhor [Ele] é o meu pastor; nada me faltará.


2 Deitar-me [Ele] faz em pastos verdejantes; 


guia-me [Ele] mansamente a águas tranqilas.


3 [Ele] Refrigera a minha alma; 


guia-me [Ele] nas veredas da justiça 


por amor do seu [dEle] nome.


4 Ainda que eu ande 


pelo vale da sombra da morte, 


não temerei mal algum, porque TU estás comigo; 

Nas palavras do teólogo judeu Martin Buber, quando oramos, não pedimos nada a Deus. O que pedimos a Deus é o próprio Deus. O convidamos a entrar em nossas vidas para que as ações que empreendemos sejam guiadas por Sua presença. Nossa natureza tem uma tendência particular de querer sempre objetivar a Deus. Deus, porém, não se enquadra na categoria de um objeto que pode ser definido. A história das religiões nos mostra muitos exemplos de tentativas de objetivação de Deus, como objeto de fé e culto.

Um relacionamento verdadeiro é constituído por dois seres que se comunicam e dialogam entre si. O relacionamento Eu-Tu é formado pelo sujeito-sujeito, sendo que o Tu representa o mundo de cada sujeito. Já na relação sujeito-objeto (Eu-Isso), o Isso, representa o objeto. Por isso, o Eu-Tu é considerado mais integral e completo, pois representa o relacionamento entre dois seres com o todo um do outro, de forma ampla e plena, ou seja, com seus pensamentos, sensações e sentimentos. Por outro lado, o Eu-Isso se configura como a relação entre o ser com apenas uma parte do todo do outro, num movimento mais distante e impessoal.

Este mesmo teólogo ao comentar o versículo bíblico, "Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Levítico 19:18) oferece esta interpretação: Imagine que está descascando uma maçã. Você segura a maçã na mão esquerda e a faca na mão direita. De repente, a faca desliza e fere a mão que segura a maçã. A mão direita deveria sentir-se aliviada por ser a mão esquerda? Deveria ficar satisfeita por ter sido poupada? Deveria olhar para a mão esquerda como um estranho que merece pena ou piedade? Claro que não; ambas as mãos fazem parte do mesmo corpo. Quando uma delas se fere, todo o corpo sente dor. É esse, segundo Buber, o significado deste versículo bíblico. Nosso vizinho faz parte de nós. Quando alguém sofre, isso deve causar dor a todos nós. Devemos sentir dor, e não piedade.

Ao que parece, a mudança de pronome (da terceira para a segunda pessoa) indica também uma mudança de relacionamento. Até chegar no vale, Davi sabia do cuidado de Deus. Ao atravessar o vale esse conhecimento se transforma em experiência pessoal bem mais próxima.

Davi não nega a ocorrência de coisas ruins aos servos de Deus, nem crê que por ser um fiel nenhum mal lhe sobrevirá. Ele afirma a existência e a ocorrência de coisas ruins, mas está convencido que Deus não exige que enfrentemos essas ocorrências sozinhos. Ele está lá conosco. E, mais que isso, podemos dizer com convicção, Ele está comigo. 

Temos uma compreensão limitada da presença de Deus ao nosso lado. Quando Jesus estava prestes a retornar ao Pai, os discípulos ficaram com medo de ficar sozinhos e  Jesus respondeu: E eu pedirei ao Pai, e ele lhes dará outro Conselheiro para estar com vocês para sempre, (Jo 14:16). A ação do Espírito Santo constrói e mantém unido o Corpo de Cristo de modo que Deus segue presente no mundo (espiritualmente) mas também de forma encarnada através da igreja. Ninguém precisa ser um crente solitário.